Qual a magia da corrida?
2/1/2025
Existe algo na corrida que atrai as pessoas. O que será? Esse pensamento pode ser um viés de confirmação, mas para mim parece que a corrida está na moda. De novo? Ou ela nunca deixou de estar? Por um tempo fui praticante e defensora ferrenha do crossfit, e acredito que no momento o crossfit está em baixa. Eu não deixei de me interessar pelo crossfit, mas a modalidade perdeu um pouco o brilho para mim. E voltei a me interessar por corrida.
Já corri antes, mas nunca me dediquei à corrida particularmente. Quando adolescente eu corria porque praticava esportes coletivos (basquete, futebol). Com dezoito anos eu decidi que queria começar a correr na rua, e depois de praticar um pouco na pista do meu antigo colégio e no parque da cidade, me aventurei a correr na rua. Depois, com vinte e muitos anos, eu corria porque fazia crossfit, mas também participava de algumas provas de corrida de rua só pela diversão. Então, a corrida sempre entrou e saiu da minha agenda. Eu gosto dela. Não sou muito de correr em esteira, porque gosto mais é do ar livre e descobri que correr de manhã cedo faz maravilhas para a minha rotina.
Isso tudo quer dizer que eu amo correr? Não. Não é isso que quer dizer. E esse é um ponto interessante. Às vezes eu acho que as pessoas, no geral, pensam que tudo que é bom para nós é maravilhoso de se fazer, que tudo deve ser prazeroso, que tudo deve se tornar fácil, e que é assim que sabemos que estamos no caminho certo. Hoje em dia acredito que isso está incorreto. Por exemplo, eu sei que correr de manhã vai melhorar meu dia no geral, vai fazer bem para a minha saúde e que a sensação após a corrida é maravilhosa. Porém, isso não anula algumas sensações ruins que a corrida envolve também, como o desconforto de acordar bem cedo, de dizer não para ficar numa cama quentinha, o desconforto de ficar suando como uma condenada, as dores musculares que ocorrem depois, e às vezes a sensação constante de querer parar a cada passada ou a cada minuto. A corrida não é só o glamour que as pessoas mostram. Esses são os dois lados da corrida (e talvez do exercício físico em si) que eu acho que as pessoas às vezes ignoram porque acham que a vida tem que ser “só” fácil. A pior coisa que alguém pode fazer para si mesmo é achar que a vida é um conto de fadas. Não é, nunca vai ser. Nós procuramos facilitar, melhorar, evoluir. Sim, com certeza. Mas assim que chegamos em algum ponto que consideramos fácil, melhor e evoluído, devemos nos regozijar por um momento, para aproveitar esse instante de felicidade, e então pensar novamente em situações difíceis e desconfortáveis que devemos viver, para continuar facilitando, melhorando e evoluindo. Se não fizermos isso, repetidamente, estamos desperdiçando tempo e consequentemente vida. Se não aproveitarmos a vida para evoluir, nos tornamos parasitas. Estaremos “parasitando” a vida de alguém, o espaço de alguém, a vontade de alguém. Eu me recuso a ser um parasita.
A vida não é um conto de fadas, tampouco é a corrida. Mas existe uma magia nela, algo que nos faz voltar, que nos faz querer fazer de novo mesmo com toda a dor (quase não dá para saber se estou falando da vida ou da corrida). Mas vamos focar na corrida por enquanto. Quando eu estava doente, grávida, mas mais doente do que grávida (por mais estranho que isso pareça) eu não conseguia me exercitar. E eu sou alguém que aprendeu a regular várias coisas através do exercício; meu estado psicológico, meu humor, meu apetite, meu sono, todas essas coisas importantíssimas eram reguladas na minha vida porque eu fazia exercício físico (e vigoroso) todos os dias. De repente, “puff”, tudo isso sumiu porque eu era incapaz de me exercitar. Acreditem, não era falta de vontade, de motivação, era falta de vitalidade, eu não era capaz de me levantar e assumir o controle do que fosse. E nesse estado, eu me vi desejando a corrida, eu queria poder correr, e ficava pensando quando eu poderia correr novamente. Acredito que poderia ser qualquer outra atividade física, era meu corpo desejando o que estava faltando. Mas para mim, naquele momento, o que eu queria era correr.
Por causa da fisiologia da doença que eu tive, a Doença Trofoblástica Gestacional, eu não posso tentar engravidar por um tempo. Aqui não convém eu especificar os detalhes ou até quanto tempo, isso varia para cada paciente. Enfim, eu usei a vontade que eu tive de correr quando estava doente, para me reerguer agora, quando estou retomando a minha saúde. Eu tenho plena consciência que é uma distração. Que é algo que eu uso para me distrair da tristeza que vez ou outra aparece, numa visita surpresa. Tenho total noção disso e agradeço pela minha disciplina e autoconsciência. Então, eu não sei para os outros, mas para mim a magia da corrida é que ela me colocou num caminho novamente. Um caminho que eu posso me dedicar, que posso me distrair, que posso recuperar minha saúde (e melhorar), e que posso sentir orgulho quando eu atingir meu objetivo e correr uma meia maratona. E com sorte, eu poderei contar para alguém um dia “quando eu não podia ser mãe, eu fiz isso, porque a vida é difícil e tudo bem, a gente sobrevive e segue vivendo”.
Façam coisas difíceis. Corram se gostam, se não gostam, corram também. Evoluam. Tornem-se melhores do que eram (você com você, sem comparação com os outros). Vivam e sejam gratos.